sábado, 17 de novembro de 2007

Outra estação


Vejo o outono transformar-se em inverno. Assim, num piscar de olhos, no instante de um bocejo. Da janela da casa toscana, espio os ciprestes que se inclinam solenemente à força do vento. Meus olhos alcançam os vinhedos logo ali, ramos nus, já desprovidos das folhas amarelas e vermelhas. Esplêndidas cores de um outono fugaz, que deslizam à terra sem dar aviso, sem despedida.

Quando vejo, é inverno. O jardim mais triste, mais austero. Ao longe, os picos das montanhas cobertos de neve. A lenha sendo consumida diariamente, crepitando sob o fogo, espalhando seu cheiro forte pela casa. Doce aconchego do lar, a manta no colo a aquecer as páginas do livro, ou sobre os ombros a embrulhar quem escreve.

Mas a melancolia bate à porta, espreita-nos por entre as frestas da janela, teima em querer entrar. Sensação de adeus, de coisas que não voltam mais, de um ciclo que se fecha, a ansiosa expectativa de um novo recomeço. Outra estação.

Não, nos deixe estar. Ainda um pouco, somente. Protegidos, escondidos em nosso refúgio. Casa no fim da estrada, depois da descida, virando a curva. Redoma fora do tempo e do espaço.


Letícia Möller
Montepulciano, 17 de novembro de 2007

2 comentários:

Anônimo disse...

Um texto tão bem escrito,que parece uma fotografia.Bjs.
linney

Letícia Möller disse...

Linney, obrigada pela presença constante. É ótimo poder contar com a tua leitura e opinião.
Um abraço!
Ah, vi que faz tempo que não publicas teus poemas...