Odele e Flávia
Há uma mulher entre tantas que, como todas, carrega sua cruz.
É uma mulher do povo, nem musa, nem estrela. Nenhum poema de renome lançou em versos, sua luta.
Como tantas mulheres, de amor vive morrendo.
É planta, árvore madura e sadia repartindo sua seiva em goles fartos, em imensa doação.
Seu nome é Odele.
Quem a viu por aí chorando? Quem percebeu seu pranto, se nem tempo tem para verter em água, o golpe? Quem vê, da árvore o líquido brotando, de dentro, dentro ao sentir que lâmina crudelíssima quase lhe arranca um ramo?
Odele é mãe de dois lindos filhos: Flávia e Fernando que seriam como tantos outros filhos, não fora a dor que esta mãe carrega, e ainda assim, cada vez mais forte e mais bela em sua luta.
Odele é a mãe da “Flávia vivendo em coma”, como conhecemos a pequena flor, quase abatida no início de sua floração pela irresponsabilidade e a ganância.
Odele é também escritora e poeta, e publica seus textos em http://oficinadepalavras.blogspot.com/
A história de Odele e sua filha? Eu conto um pedaço: Flávia tinha apenas 10 anos quando seus cabelos foram sugados pelos ralos da piscina do condomínio, onde a família morava no bairro Moema, em São Paulo. Foi retirada da piscina e levada para a UTI do Hospital Santa Isabel, em coma. E assim permanece já há dez anos.
"Flávia segue inconsciente, em coma vigil. Abre os olhos durante o dia e os fecha à noite. Mas não interage com o meio ambiente e é completamente dependente para toda e qualquer atividade da vida. Ao longo dos anos, devido ao tempo em que fica imóvel vem adquirindo deformidades severas que torna o quadro ainda mais doloroso e difícil de cuidar" (Odele).
Odele luta há 10 anos por justiça. Há dez anos, espera, os braços fortalecidos na luta diária com seu raminho de frágil existir. Há dez anos, Odele luta, sem desistir.
Ela é meu exemplo de mulher.
Quer saber mais sobre Odele e Flávia? Visite-as em http://flaviavivendoemcoma.blogspot.com/
Em dezembro, escrevi este pequeno poema para Flávia
FLÁVIA, A FLOR E SUA ÁRVORE
Há uma flor profundamente adormecida
e a beleza de sua árvore.
como é a sina das árvores, esta vela
em força, também em dor.
Nem os ventos, os ventos frios dos dias,
que arrancam lamentos entre os ramos e as folhas,
perturbam a linda flor, em seu sono.
Qual princesa dorme a flor,
dos contos de fada, personagem.
Porém nenhum príncipe virá
com seu beijo de acordar
e nem o espera a princesa em flor.
A árvore, cuidadosa, vela.
Sua seiva milagrosa mantém a vida
da linda flor e seu sorriso raro.
A árvore espera que o vento se vá,
ainda que fique a dor.
Se não há príncipe a caminho,
há o dragão da injustiça
a ser combatido todos os dias,
único capaz de vergar a árvore e
deixar solta do ninho, a flor.
(Saramar Mendes)
Saramar Mendes
Funcionária pública, aprendendo a luta com as palavras.